
O terapeuta Alberto ajeita os óculos, pega a caneta e sorri para o casal sentado no sofá à frente.
— Então, casal, o que os traz aqui? — pergunta, confiante.
— Doutor, nós temos tido dificuldades no nosso relacionamento — diz Judite.
— Sério? Que coincidência… todos que vêm aqui também têm este problema — brinca Alberto.
O casal se olha com um ar de esperança, como se ele tivesse acabado de revelar um segredo revolucionário.
— Mas me contem um pouco da relação de vocês — continua ele.
— Em que ponto, doutor? — questiona Pedro.
— No cotidiano, por exemplo.
Judite começa:
— Eu gosto de ler romances históricos, ele não lê nada além do manual do micro-ondas.
Pedro rebate:
— Eu gosto de campo, ela só gosta de praia.
Judite:
— Eu sou vegetariana. Ele caça por esporte.
Pedro:
— Eu sou evangélico, ela é ateia.
Judite:
— Eu durmo cedo, ele acha que “madrugada” é uma forma de vida.
Pedro:
— Eu odeio gatos, ela só fala em ter um deles.
Judite:
— Eu sou organizada, ele acha que “organização” é uma teoria da conspiração.
O terapeuta começa a suar.
Pedro continua:
— Eu não gosto de viajar, ela já tem mala pronta no porta-malas.
Judite:
— Eu gosto de silêncio, ele é percussionista de escola de samba.
O terapeuta tenta sorrir.
— Certo… é… bom… — gagueja ele — vocês ao menos têm algo em comum?
O casal pensa por alguns segundos e responde em uníssono:
— Sim. Nenhum de nós gosta de terapia de casal.
O terapeuta larga a caneta e engole seco.